Legalização das Drogas? - Um panorama social possível.
Sociologia

Legalização das Drogas? - Um panorama social possível.


No Brasil, estamos em um momento bastante importante para a construção de reformas e avanços (ao mesmo tempo, ficamos abertos para retrocessos e radicalismos). Sobre este ponto, pretendo discutir aqui de forma ampla as implicações sociais de uma possível legalização do consumo de drogas, ou mesmo de uma maior radicalização de leis anti-drogas.
Gosto muito do facebook, pois ali tenho contato com distintas visões de mundo, acesso direto as pessoas que vivem grupos e lugares que estão muito distantes do meu cotidiano. Começo analisando um post´s recorrente na minha linha de tempo do meu perfil nesta rede social:
  Este post é recorrente e tende a apresentar uma realidade simplista com base em uma lógica simples, onde somente as drogas consideradas ilícitas teriam resultados catastróficos se fossem legalizadas. Ou seja, pilotos de avião, médicos, motoristas, etc, poderiam utilizar essas drogas, atrapalhando sua atenção e isso aumentaria os índices de acidentes e mortes.
   Existe aqui uma GRANDE simplificação. Primeiro que TODO o profissional que se faz ético sabe que QUALQUER SUBSTÂNCIA que altera a atenção, coordenação ou mesmo sua percepção não deve ser utilizada em serviço. (E aqui entram TODAS as substâncias que possuem essas características). Como assim? Atualmente temos uma infinidade de drogas LICITAS que levam ao seu usuário, a ter alterada a sua atenção, coordenação ou mesmo sua percepção. Porém, são vendidas em farmácias e prescritas por médicos.
     Ou seja, mesmo antes de qualquer mudança na nossa realidade da leis de consumo, venda e plantio de drogas, temos o mesmo risco de ter um médico, motorista, piloto usando Ritalina, Lexotan, Rebite, etc. Então cabe a mesma pergunta:  Você aceitaria ser operado por um médico que acabou de virar a noite em um plantão e tomou estimulantes para te operar? Quais seriam as reais fronteiras entre as drogas leais e ilegais. Neste ponto não existe nada perto de um consenso. O que temos são distintas contradições e simplificações. Anteriormente discuti o vício no açúcar, seria ela uma droga? Ver: http://autonomiasociologica.blogspot.com.br/2015/02/o-vicio-no-acucar-e-as-drogas-legais-do.html 
        Para fechar este primeiro ponto, poderíamos incluir na lista das drogas usuais em nosso cotidiano como a cocaína, extase, o LSD, redutores de apetite sem prescrição e etc  que está em TODOS os meios sociais e normalmente utilizada pelos mais afortunados que a utilizam em seu cotidiano como estimulante de trabalho e forma de aguentar a rotina de trabalho (Como muitos utilizam o café). Mas também um estimulante para aguentar festas de 12hs de duração, algo comum e que TODOS convivem com usuários ou ex-usuários de alguma substância química ilícita (E olha que não falei dos esteróides, as chamadas "bombas", utilizadas nas academias e que seus usuários não as consideram drogas. Hum, contradições importantes, não?).   
     Se discutirmos o problema do tráfico de drogas, temos problemas que são anteriores ao tráfico de drogas no Brasil. A desigualdade social e a pobreza são questões muito profundas e sérias, que refletem diretamente na "função" que estas mesmas classes sociais no lógica do tráfico e consumo de drogas. Então cabe a seguinte pergunta: quem são os que cumprem a função de traficantes de asfalto no nosso país? Ou seja, quem fica na linha de frente como "vendedor" ou avião do tráfico, para suprir uma demanda de TODAS as classes sociais? No Brasil a desigualdade e a pobreza vieram antes do tráfico de drogas. Um ótimo documentário que apresenta uma ampla discussão em um Brasil da Década de 90, chamado: Notícias de Uma Guerra Particular. Este documentário apresenta uma visão ampla da realidade do tráfico do Rio de Janeiro, e busca dar voz a depoimento que compõe três ângulos distintos sobre a realidade da droga: O documentário apresenta o depoimento de moradores, dos policiais e dos traficantes. Vale muito assistir. 
   
Alguns países vivem experiências vivas de formas de construir a legalização e a regulação do consumo, comércio e cultivo de drogas. Temos muito material na internet sobre essas experiências. Mas é inegável que existe nestes países uma pressão internacional muito forte, defendendo que a política de repressão do consumo e venda de drogas deve ser mantido, como exemplo temos os EUA (ver: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-11/pressao-politica-dos-eua-dificulta-legalizacao-das-drogas-diz-greenwald) 
Uma passagem que ilustra bem essa matéria indicada acima é o depoimento de uma assessora do Instituto e Controle da Cannabis (IRCCA) "?A imprensa mundial está lá no Uruguai e diz: 'Pensamos que chegaríamos aqui e estaria todo mundo drogado'. Essa é a fantasia da proibição, mas não aconteceu nada disso. Nada mudou. As pessoas continuam na mesma atitude?,

Inclusive um documentário que é anterior a legalização do Uruguai, chamado Quebrando Tabu, mostra o fracasso da política anti-drogas dos EUA e percorre as experiências de legalização e regulação. Vale conferir, apesar do discurso superficial em alguns momentos do nosso ex-presidente FHC.

       Sobre a possível mudança na questão do consumo e comércio de Drogas em um país como o Brasil, podemos apontar aqui dois grandes cenários opostos: 
       A radicalização e o aumento das punições para os envolvidos com o tráfico e consumo de drogas (Algo que os EUA praticam na maioria dos seus Estados) teria como resultado a ampliação da massa carcerária, uma polícia ainda mais repressiva e muitas e muitas campanhas moralistas, tal como é apresentado neste Manifesto Contra a Legalização das Drogas no Brasil.  (ver: https://www.change.org/p/congresso-nacional-manifesto-contra-a-legaliza%C3%A7%C3%A3o-das-drogas-no-brasil) Em grande parte este manifesto faz sentido. Quem gostaria de viver em um país onde seus filhos e netos são expostos a dependentes químicos e a traficantes.  Porém, se olharmos com mais cuidado, este manifesto deixa de fora a discussão de outras tantas substâncias licitas que são vendidas legalmente em qualquer farmácias ou supermercados. Ou seja, simplifica para defender uma solução conservadora e limitada. 
     Vejo muitas famílias que se auto-medicam e trocam medicamentos entre si (Não seria essa prática algo próximo de um tráfico ou mesmo de um fornecimento ilícito de substâncias não prescritas?) E isso não está contemplado no manifesto anteriormente citado, por isso ele é em grande parte, MORALISTA. Parte de uma ideia que remédio não é droga, e que algumas drogas lícitas como o álcool ou o tabaco podem ser utilizadas de forma recreativa ou, segundo as propagandas, se utilizados com parcimônia ou cautela. Essa última parte, não serviria para pensar a legalização do consumo e plantio de algumas drogas que hoje são consideradas ilícitas? Veja uma curta entrevista onde vemos claramente a postura moralista da repórter da Globo News e a visão ampliada de uma pesquisadora do tema e que aponta para a inexistência de sociedades sem drogas na história da humanidade, confira a curta entrevista: 

Um segundo cenário, identificamos que existem hoje diversos movimentos que ampliam a discussão e lutam pela regulação da venda, consumo e plantio de algumas drogas, a mais publicizada é a legalização da maconha. Escutar os movimentos sociais é fundamental para entender as novas pautas e reivindicações. Se o maior problema é o tráfico, uma solução seria a produção individual, como é feito no Uruguai, limitando o número de pés de Cannabis por pessoa? Seria uma solução definitiva? Não. Pois temos outras drogas que não se enquadram nesta questão. Se o consumo vai aumentar ou diminuir, é muito complicado, pois as pesquisas não captam a realidade do consumo. Quem diria abertamente que usa drogas ilícitas hoje no Brasil, sendo que comprar e usar drogas é crime? 
      Neste segundo cenário teríamos então a possibilidade de retirar parte da droga dos traficantes e levar para cada usuário a ter o direito de plantar ou comprar em alguma cafeteria ou loja especializada que faria o controle de qualidade, gerando impostos para o tratamento de seus dependentes e etc. Isso é um cenário que parece ser a solução, mas que beira uma contradição com o início do que foi apresentado no texto. 
      Pois no momento em que reduzirmos o mercado ilícito de drogas, ainda teremos a desigualdade e a pobreza no Brasil. Ou seja, outros crimes rentáveis irão ganhar espaço, inclusive o roubo de cargas de remédios e das próprias drogas que agora serão vendidas nos mercados, cafeterias e farmácias com valor alto por causa dos impostos e intermediários legais envolvidos (estaríamos portanto, elitizando o acesso ás drogas). O que esta proposta de modificação das leis propõe não é uma solução mágica, mas um primeiro passo para a modificação da educação que deveríamos construir no interior dos lares e nas escolas. Ao invés de ser crime, o acesso legalizado convidaria a população a discutir o consumo destas e outras substâncias. (Vale a leitura do blog da minha colega e amiga Luciana Rossato, Farmaceutica e professora da UPF): 
(http://paracelsusparatodos.blogspot.com.br/2015/03/aspectos-legislativos-da-maconha.html)
       Precisamos discutir o consumo de QUALQUER substância, inclusive o álcool, as gorduras, os remédios, o açúcar, o tabaco, e porque não, a maconha, a cocaína e etc. Precisamos discutir e lutar na ampliação da discussão e da educação da próxima geração. Ou seja, se faz agora necessário a criação de espaços para discutir abertamente qual seria o caminho para a regulações do consumo, plantio e comércio das drogas consideradas até o momento ilícitas e quais as formas com que isso pode ser feito dentro da realidade Brasileira. Precisamos superar simplificações e moralismos, pois somos uma espécie específica que procura formas químicas de prazer (Pelo menos é o que os diferentes estudo das diferentes culturas de diferentes povos que habitaram e habitam esta terra nos mostram).  
       
O que não podemos fazer é descolar a discussão do contexto social e econômico em que estamos vivendo no Brasil. E esse cuidado é importante tanto no cenário de defesa da legalização ou regulação ou no cenário de um endurecimento das punições aos crimes relacionados ao consumo e venda de drogas no Brasil. Aqui neste país, traficantes e usuários estão em TODOS os espaços sociais em em TODAS as classes sociais. A grande questão é que as leis e atuais punições estão normalmente focadas em políticas de repressão e violência dos mais pobres. Ou seja, o cenário atual que vivemos é injusto e moralista e precismos avançar urgente nesta discussão. Pergunto qual a explicação dos defensores da manutenção da nossa realidade repressora em que NUNCA acontece a mesma truculência policial e suas práticas repressivas (Comuns e cotidianas em festas de comunidade e em favelas) ocorrendo em festas da classe média ou da elite. 
E mesmo se você tiver como bandeira o combate ao tráfico de drogas, me explique o motivo de não presenciamos a polícia arrombando a porta das mansões para fiscalizar as festas regadas a cocaína, prostituição e traficantes. Hum... interessante. E você, o que tem a dizer sobre isso? Se informe, leia e venha discutir, ID! 




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